O Brasil vive uma pandemia de Covid-19 e de reformas tributárias, onde os governantes usam o primeiro para justificar as últimas. No Congresso, tramitam as PEC 45 (Câmara) e 110 (Senado), simultaneamente ao PL 3887/2020, do Executivo, que cria a CBS. Outros projetos do Executivo estão na iminência de serem apresentados aos parlamentares. Nos estados, já tramitam o PL 529/2020 em São Paulo e o PL 184/2020, no Rio Grande do Sul. O que eles têm em comum? Passam ao largo das especificidades do setor sem fins lucrativos. Organizações da Sociedade Civil (OSCs) e Instituições de Ciência e Tecnologia (ICTs) vivem de doações e de mensalidades de associados e mantenedores. Ocasionalmente, recebem patrocínios a projetos via leis de incentivo e repasses de recursos públicos por meio de parcerias, com rigorosas normas de prestação de contas. Algumas poucas empreendem prestação de serviços e venda de mercadorias, sempre com o intuito de obter receita para o desenvolvimento de suas finalidades institucionais. Por serem sem fins lucrativos, não têm donos, sócios ou acionistas, e têm que aplicar todos os seus recursos em suas próprias atividades, sem qualquer distribuição de lucros. A PEC 110, no Senado, cria um imposto federal sobre transmissão causa mortis e doação, que se somará ao ITCMD hoje de competência dos estados e do Distrito Federal. Uma dupla tributação da filantropia e do apoio à pesquisa, que poderá ter alíquota muito elevada, já que hoje o ITCMD pode chegar a 8% e é provável que a alíquota do novo ITCMD não fique em menos de 4%. As receitas de doações também não foram excluídas da base de cálculo da CBS de 12% do PL 3887/2020. Tudo somado, pode implicar em uma brutal alíquota de 24%, a qual, não nos enganemos, poderá ainda subir se uma nova CPMF for proposta. A notícia boa no campo das doações é que o PL 529/2020, do dovernador João Dória, amplia a isenção hoje existente na Lei 10.705/2000, para beneficiar quaisquer entidades sem fins lucrativos com sede no estado de São Paulo, desde que tenham sido constituídas e se encontrem em funcionamento regular há, no mínimo, um ano e mantenham atividades em ao menos uma das finalidades descritas nos incisos do artigo 3º da Lei federal nº 9.790/1999 (Lei de Oscips). As organizações gaúchas não terão, contudo, a mesma sorte, pois não só o PL 184/2020, do governador Eduardo Leite, não previu isenção para as doações às OSCs e ICTs, como também aumentou a alíquota máxima do imposto, de 4% para 6% em doações e de 6% para 8% em transmissões sucessórias. A situação das doações e patrocínios a projetos via leis de incentivo também não ficará melhor. Primeiro, porque serão tributadas pela CBS do PL 3887/2020, à alíquota de 12%, já que são receitas vinculadas à atividade ou objeto principal da pessoa jurídica. Se o apoio for por meio de doação – previsto explicitamente nas Leis Rouanet e de Incentivo ao Esporte, por exemplo, e indiretamente na Lei do Bem – incidirá também o ITCMD, agora majorado no RS para 6%, sem contar o federal, da PEC 110. O PL 529/2020, do governador João Dória, propõe a redução dos benefícios fiscais no ICMS, o que pode impactar sensivelmente o PROAC. Uma pancada. Outro aspecto das reformas tributárias das PEC 45 e 110 é a criação de um imposto substituto do ICMS (o novo IBS). De acordo com ambas as propostas, o IBS não poderá ser objeto de qualquer tipo de incentivo ou benefício fiscal ou financeiro vinculado ao imposto. Consequentemente, estarão mortas todas as leis de incentivo estaduais para a cultura, o esporte, a inovação e pesquisa científica e todas as outras causas. No campo dos repasses de recursos públicos por meio de parcerias, as PEC nada tratam, mas a CBS os alcança já que são receitas vinculadas à atividade ou objeto principal da pessoa jurídica. Acréscimo de custo de 12% nos projetos. Com isso, o PL 3887/2020 transfere ao erário federal, via CBS, recursos das fazendas dos estados, do Distrito Federal e dos municípios repassados para projetos. Governadores e prefeitos têm que ficar de olho nisso! Por fim, para as poucas organizações que prestam serviços e vendem mercadorias com o intuito de obter receita para o desenvolvimento de suas finalidades institucionais, grandes desafios se avizinham. Isso porque as OSCs e ICTs, sendo associações ou fundações, não são elegíveis ao regime do Simples Nacional, disponível apenas para sociedades e empresários. Consequentemente, terão que adotar os procedimentos mais complexos do IBS e da CBS concebidos para as grandes empresas, como já se observa hoje na apuração do PIS e Cofins pelo regime não-cumulativo, pois foram esquecidas pelas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003. Os projetos de reforma tributária trazem tempos obscuros para a filantropia e a ciência, que tanto estão fazendo para combater o coronavírus e seus efeitos. É necessário agir no Congresso e nas Assembleias Legislativas para que nossas OSCs e ICTs não venham a precisar de respiradores. *Fonte: jota.info - EDUARDO SZAZI – Advogado, doutor em Direito pela Leiden University.
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